Um avanço na nanotecnologia acelera a produção de vacinas
Embora continuem a surgir surtos de covid-19 impulsionados pelas variantes Delta, os dados ainda mostram que as vacinas são eficazes em prevenir hospitalizações e mortes. Embora mais de 4 bilhões de doses de vacina tenham sido administradas em todo o mundo, apenas 27% da população mundial e apenas 1,1% das pessoas em países de baixa renda receberam pelo menos uma dose da vacina contra a covid-19. Embora existam muitos desafios na cadeia de fornecimento para a produção e distribuição dessas vacinas (refrigeração, custos e transporte), especificamente a produção de nanopartículas lipídicas para vacinas é um deles.
Figura 1: Detalhamento da proporção de pessoas vacinadas por país e continente
Por que as nanopartículas lipídicas são essenciais para a terapia de mRNA?
A entrega de terapias de mRNA no corpo humano tem sido um grande desafio por causa da instabilidade e propriedades inerentes ao ácido nucleico:
- A carga negativa e a hidrofilicidade impedem a difusão passiva através das biomembranas
- A associação com proteínas séricas, captação por fagócitos e degradação por nucleases endógenas obstruem a entrega eficiente
- São necessários vetores de entrega para proteger as nanopartículas da degradação e entregá-las às células-alvo para uma absorção eficiente.
As nanopartículas lipídicas (LNPs) provaram ser bem-sucedidas em proteger e transportar efetivamente o mRNA para as células, como visto nas recentes vacinas de mRNA contra a covid-19.
A produção de vacinas está limitada pela produção de nanopartículas lipídicas
É difícil redimensionar a produção de qualquer terapia, mas a produção das nanopartículas lipídicas para atender a demanda mundial por vacinas é um desafio ainda maior. A síntese dos lipídios catiônicos ionizáveis proprietários, especialmente desenvolvidos e otimizados para essas vacinas, é um processo complexo com várias etapas. Mas, há um desafio ainda maior na produção de LNP em larga escala – a tarefa de combinar os lipídios e o mRNA em nanopartículas.
De fato, a técnica de fabricação é de extrema importância para a produção eficiente de uma formulação farmacêutica. Os métodos tradicionais de fabricação de LNP, dos quais citados alguns aqui, mas não todos, como hidratação de filme fino, evaporação de fase reversa, injeção de solvente e remoção de detergente, geralmente resultam em partículas grandes (> 100 nm) e heterogêneas com baixo rendimento de encapsulamento, exigindo uma etapa adicional de redução, como extrusão ou sonicação. Além disso, esses métodos são difíceis de ampliar e não podem ser reproduzidos de maneira consistente.
A microfluídica é uma nova abordagem
Recentemente, a microfluídica provou ser bem-sucedida na produção de LNPs. No método de focalização microfluídica, um fluxo de solução lipídica em álcool é forçado através de um canal que é intersectado e revestido por um fluxo coaxial de uma fase aquosa (Figura 2A). A difusão recíproca de álcool e água pela interface álcool/água faz com que o lipídio se precipite e se auto-organize em LNPs. As técnicas microfluídicas são robustas, redimensionáveis e altamente reprodutíveis. Para formulações de vacina de mRNA, a mistura lipídica inclui um lipídio catiônico ionizável, juntamente com um PEG-lipídio e lipídios auxiliares (fosfatidilcolina, colesterol), enquanto a fase aquosa contém o ácido nucleico. O lipídio catiônico interage com o ácido nucleico carregado negativamente, resultando em LNPs com alta eficiência de encapsulamento. Podem ser produzidas LNPs de tamanhos definidos e distribuição de tamanho estreito ao controlar com precisão os parâmetros operacionais microfluídicos, como taxa de fluxo e relações de componentes. No entanto, o rendimento do processo é limitado (
Figura 2. Um dispositivo microfluídico de canal único (A) e um dispositivo microfluídico paralelizado (B) original contendo 128 canais de micromistura que trabalham em paralelo
Os primeiros resultados são promissores
Um avanço recente na tecnologia de fabricação permitiu um aumento de mais de 100 vezes nas taxas de produção microfluídica atuais. Foi construído um dispositivo microfluídico contendo 128 canais de micromistura que trabalham em paralelo – um dispositivo microfluídico paralelizado, utilizando uma tecnologia de plataforma de integração microfluídica de grande escala (VLSMI). Os canais misturam quantidades precisas de lipídios e mRNA, criando nanopartículas lipídicas de tamanho controlado e quantidade de mRNA encapsulado com precisão. O dispositivo rende mais de cem vezes que um dispositivo microfluídico de canal único (18,4 L/h) e oferece uma excelente possibilidade de ampliar ainda mais, permitindo assim a produção em massa de nanopartículas lipídicas portadoras de RNA. Os resultados publicados indicam que o dispositivo microfluídico paralelizado produz nanopartículas lipídicas eficazes para uso em terapias e vacinas baseadas em siRNA e mRNA.
A produção de nanopartículas lipídicas viabilizará mais terapias de mRNA
O desenvolvimento de tais vacinas e terapias tem o potencial de revolucionar a medicina pela edição de genes e terapias de substituição de proteínas. Atualmente, as vacinas de mRNA baseadas em LNP entraram em ensaios clínicos contra uma variedade de doenças infecciosas, como vacinas de mRNA modificadas por nucleosídeos para vírus Zika, citomegalovírus, tuberculose e influenza. As vacinas terapêuticas de mRNA têm grande potencial na imunoterapia do câncer contra melanoma, câncer de ovário, câncer de mama e outros tumores sólidos.
É muito promissor o uso de mRNA para a expressão de proteínas terapêuticas no tratamento de uma vasta gama de doenças com a aplicação de terapia de substituição de proteínas. Essa tecnologia de fabricação microfluídica recém-desenvolvida atende à necessidade clínica de produção dimensionável de LNP, altamente precisa e reproduzível, permitindo assim a formulação rápida de LNPs para uma ampla gama de terapias e vacinas de RNA. Embora isso possa não apenas resolver o desafio da distribuição global, é um avanço crítico em uma nova era de possíveis curas e vacinas que o mRNA pode viabilizar.